Anna Paula Buchalla
Utilizado em larga escala nos Estados Unidos,
o remédio Ritalina experimenta um aumento de consumo surpreendente no Brasil.
O número de prescrições do medicamento, um estimulante para
o tratamento do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade,
mais que dobrou nos últimos dois anos. Só neste ano, estima-se que
será vendido 1 milhão de caixas de Ritalina, fabricado pelo laboratório
Novartis.
A principal razão desse aumento é o fato de que o diagnóstico
do distúrbio se tornou mais comum. Antes considerado um mal predominantemente
infantil, a hiperatividade passou a ser detectada também em muitos adultos.
Além disso, há quem use o medicamento simplesmente para se manter
desperto durante longas jornadas de trabalho ou estudo. E, como acontece com boa
parte dos remédios da família das anfetaminas, a Ritalina entrou
na ilegalidade. Jovens em busca de euforia química e meninas ávidas
por emagrecer estão usando o remédio sem dispor de receita médica.
Caracterizada por quadros de agitação,
impulsividade e dificuldade de concentração, a hiperatividade, nos
últimos dez anos, ganhou maior atenção de médicos,
psicólogos e pedagogos – principalmente porque se passou a creditar
ao distúrbio boa parte dos casos de mau desempenho escolar. Dispor de um
remédio como a Ritalina é um avanço inegável. Mas
o "sossega leão" tem um lado perverso: o dos excessos. Pais acusam escolas
de rotular suas crianças de hiperativas indiscriminadamente, antes mesmo
de obter um diagnóstico médico. Tudo porque os professores, segundo
esses pais, não teriam paciência, nem disposição, para
controlar crianças irrequietas – mas não necessariamente com
desequilíbrio na química cerebral – na sala de aula. Tais escolas,
por sua vez, alegam que seus professores são suficientemente treinados
para identificar o problema. Há que levar em conta, ainda, que pais impacientes
andam utilizando o diagnóstico de hiperatividade como desculpa para entupir
seus filhos de remédio e mantê-los, dessa forma, sossegados. Tanto
é assim que o medicamento foi batizado de "droga da obediência".
"É freqüente que os pais peçam aos médicos que aumentem
a dose de Ritalina ou não a interrompam durante as férias", diz
a psicóloga carioca Marise Corrêa Netto.
A hiperatividade infantil costuma aparecer entre os 3 e os 5 anos. O distúrbio
é três vezes mais comum em meninos. Pesquisas feitas nos Estados
Unidos mostraram que até um terço dos garotos em idade escolar naquele
país usa Ritalina, embora muitos deles não precisem. Um estudo recente
da Universidade Estadual de Campinas revelou que, de um grupo de crianças
diagnosticadas com hiperatividade, 23% não exibiam problemas de aprendizado.
Ou seja, provavelmente estavam sendo tratadas de um distúrbio do qual não
sofriam. Vários educadores acreditam que se rotulam muitas crianças
de hiperativas só porque elas são bagunceiras. "É preciso
tomar muito cuidado com a medicalização da educação",
diz a psicanalista carioca Christiane Vilhena, especialista em desenvolvimento
infantil.
Enquanto a polêmica segue no universo
infantil, a Ritalina vai conquistando de maneira silenciosa adeptos nas universidades.
Pressionados por provas, exames e trabalhos de faculdade, estudantes estão
trocando o tradicional café com cigarro pelo remédio. A Ritalina,
nesses casos, teria o objetivo de melhorar a concentração e diminuir
o cansaço. Seria uma espécie de anabolizante para o cérebro,
que conseguiria assim acumular mais informação em menos tempo. Um
levantamento feito na Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, mostrou que
um em cada cinco estudantes da instituição já havia experimentado
a Ritalina com esse único propósito. No mercado de trabalho, ela
também entrou para o cardápio: executivos passaram a procurar no
medicamento uma forma de suportar batentes que costumam ultrapassar dez horas.
Um dos aspectos mais preocupantes do uso da Ritalina
é o recreacional. Alguns adolescentes trituram as drágeas e cheiram
o pó. Outros diluem o comprimido em água, para injetá-lo
na veia. Essas injeções, no entanto, podem causar complicações
sérias. Pequenos pedaços da pílula podem obstruir vasos sanguíneos
e levar a distúrbios pulmonares e cardiovasculares graves. Por último,
há garotas que lançam mão do remédio para emagrecer
– um dos efeitos colaterais da Ritalina, descrito na bula.
A Ritalina, nome comercial do metilfenidato, foi lançada em 1956. O efeito
paradoxal do remédio é que, embora seja um estimulante, em doses
muito precisas ele acaba por acalmar seus usuários, ao torná-los
mais concentrados – daí seu uso em crianças hiperativas. O
mecanismo de ação da Ritalina ainda não foi completamente
desvendado. Recentemente, com o auxílio de um exame de última geração,
a tomografia por emissão de pósitrons, pesquisadores conseguiram
identificar um aumento nos níveis de dopamina em homens saudáveis
que tomavam o remédio. A dopamina é uma substância produzida
no cérebro, associada à sensação de bem-estar, euforia
e estado de alerta.
Fonte: //veja.abril.com.br/271004/p_068.html
2 comentários:
Bom dia, qual email eu posso enviar sugestão de pauta? Obrigada!
Olá Nathália Nakaza obrigado pela sua iniciativa em querer ajudar , desculpa pela demora ... Poderá me enviar sugestões por aqui mesmo.
Obrigado!
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